Neste final de ano
fui acampar em Cambury das Pedras, assim como faço há mais de 15 anos.
No dia 22 de dezembro, debaixo de forte chuva, entrei no camping da Dona Maria e subi mata adentro para montar minha barraca.
Enquanto subia a trilha, vi várias galinhas circulando pelo terreno, algumas inclusive próximo de onde eu iria armar a barraca. Todas ciscando o chão a procura de algo pra comer.
Armei minha barraca, arrumei as coisas e fui para a praia dar o meu primeiro mergulho e tomar minha primeira pinga-com-mel de boas vindas.
Quando volto para a barraca, isso por volta das 11 horas da noite, percebo que uma galinha ainda permanecia arrodeando o local. Não me importei e desmaiei na barraca.
No outro dia pela manhã, abro a tela da barraca e me deparo com uma galinha me observando. Uma galinha preta, porte médio - algo meio entre uma franga e uma galinha adulta - com a parte posterior das asas bem feridas e com um machucado nas costas, que a princípio me pareceu ser sarna. Mas depois pensei "sarna em galinha? acho que não!"
Os dias se passavam, fizesse chuva, fizesse sol, e a galinha continuava ciscando em torno da minha barraca.
Para o azar da mesma eu havia perdido uma das minhas bolsas com panelas, talheres e comida. Logo, nada por ali a ser furtado que interessasse a galinha. O que me fazia pensar porque ela não ia para junto das outras galinhas e comer a ração que era distribuída pela Dona Maria? Mas ela ficava por ali e com certeza não era devido a minha ilustre companhia.
Após o Natal, chegaram meus primeiros vizinhos de acampamento, cerca de sete pessoas, e junto com eles, a comida.
Panelas com arroz, feijão, vasilhas com salada, vários sacos com alimentos não perecíveis, enfim, o paraíso para uma galinha que esperava avidamente por fartura. Muito ao contrário do vizinho pobre que só tinha bitucas de cigarro a oferecer.
Ao ver a galinha, um dos vizinhos apontou risonho "uma galinha preta de macumba!", todos riram, e um outro emendou: "deixa ela vacilar que vai pra panela".
No dia 30 chegaram alguns amigos meus, C, V e E. Eles iam acampar em outro camping, mas como já estavam todos lotados e sabiam que eu estaria por ali, resolveram me fazer companhia.
Como bons amigos, trouxeram comida, muita comida.
A galinha não saia de perto dos alimentos. Assim que a gente se afastava do acampamento, lá ia a galinha e começava a bicar tudo que se encontrava disponível. As outras galinhas também se aproximavam, mas assim que a gente as tangia corriam e não voltavam. Já a galinha preta não se afastava de jeito nenhum e dormia por ali mesmo.
Em um dos dias montei um pratão daqueles de pedreiro, arroz, feijão, salada - a fome era grande - e quando me virei pra pegar o suco .... lá estava a galinha, praticamente dentro do meu prato.
Minha irritação foi tamanha que peguei um arbusto que estava jogado e sai com sangue no zóio tentando dar uma lição definitiva na galinha impostora.
Corri por cerca de 15 minutos pelo meio da mata tentando pega-la, sem sucesso é óbvio, mas satisfeito pelo fato dela ter ficado bem distante do acampamento e dos alimentos.
Fomos à praia e quando voltamos, quem estava lá? A galinha.
No outro dia pela manhã, enquanto aguardava uma pessoa tomar banho na ducha, vi um galo branco enorme, e quando falo grande, é porque era grande mesmo.
O galo que provavelmente era o garanhão do galinheiro, além de seu tamanho, chamava a atenção por puxar uma das patas, que em algum momento de sua vida sofreu uma fratura.
De repente esse galo entra no galinheiro, repleto de galinhas, cerca de 20 pelo menos e o desespero tomou conta das galinhas.
Com uma violência que eu nunca tinha visto antes, o galo pegava as galinhas e com toda a força as bicava nas costas, arrancando penas e o coro. Algumas saiam pingando sangue.
Por uma fresta na tela que cercava o galinheiro, as galinhas se espremiam para fugir da violência do galo. A violência do galo não era para copular com as galinhas, era pura violência, pura maldade mesmo, tipo dizendo: "quem manda nessa porra sou eu!"
Ai pensei na galinha preta que vivia rodeando minha barraca. Mas dessa vez com um sentimento de pena, de dó. Provavelmente ela se recusará a descer e viver enclausurada no galinheiro sofrendo a violência das bicadas do galo.
Por isso vivia isolada das outras galinhas, sem a comida fácil que lhe era jogada pela Dona Maria no galinheiro, sendo obrigada procurar e viver do alimento encontrado na mata: formigas, minhocas, grilos, vaga-lumes, cigarras e coisas furtadas dos campistas.
Mas depois pensei que eu não deveria ter dó e nem pena da galinha, afinal, ela teve a coragem de fugir do galinheiro e se recusar a viver no sofrimento. Preferiu a reclusão à submissão. Preferiu a violência do vento e da chuva ao sofrimento de viver sendo espancada diariamente em um galinheiro.
Na minha brisa, comecei a pensar na galinha como uma heroína, um exemplo de postura para todas as outras galinhas do galinheiro, e porque não do mundo?
Pensei que quando as outras galinhas subiam a mata para ciscar, se não sentiam inveja da independência da galinha preta que se recusou a apanhar gratuitamente todos os dias?
Pensei até se se a galinha preta não fazia discursos para convencer as outras, tipo, galinhas do terreno da Dona Maria, uni-vos!
Todos esses pensamentos enquanto eu esperava pra tomar banho. Mas depois disso passei olhar a galinha preta com outros olhos e passei a respeitá-la.
Parei de pertuba-la por querer furtar nossa comida.
No dia 22 de dezembro, debaixo de forte chuva, entrei no camping da Dona Maria e subi mata adentro para montar minha barraca.
Enquanto subia a trilha, vi várias galinhas circulando pelo terreno, algumas inclusive próximo de onde eu iria armar a barraca. Todas ciscando o chão a procura de algo pra comer.
Armei minha barraca, arrumei as coisas e fui para a praia dar o meu primeiro mergulho e tomar minha primeira pinga-com-mel de boas vindas.
Quando volto para a barraca, isso por volta das 11 horas da noite, percebo que uma galinha ainda permanecia arrodeando o local. Não me importei e desmaiei na barraca.
No outro dia pela manhã, abro a tela da barraca e me deparo com uma galinha me observando. Uma galinha preta, porte médio - algo meio entre uma franga e uma galinha adulta - com a parte posterior das asas bem feridas e com um machucado nas costas, que a princípio me pareceu ser sarna. Mas depois pensei "sarna em galinha? acho que não!"
Os dias se passavam, fizesse chuva, fizesse sol, e a galinha continuava ciscando em torno da minha barraca.
Para o azar da mesma eu havia perdido uma das minhas bolsas com panelas, talheres e comida. Logo, nada por ali a ser furtado que interessasse a galinha. O que me fazia pensar porque ela não ia para junto das outras galinhas e comer a ração que era distribuída pela Dona Maria? Mas ela ficava por ali e com certeza não era devido a minha ilustre companhia.
Após o Natal, chegaram meus primeiros vizinhos de acampamento, cerca de sete pessoas, e junto com eles, a comida.
Panelas com arroz, feijão, vasilhas com salada, vários sacos com alimentos não perecíveis, enfim, o paraíso para uma galinha que esperava avidamente por fartura. Muito ao contrário do vizinho pobre que só tinha bitucas de cigarro a oferecer.
Ao ver a galinha, um dos vizinhos apontou risonho "uma galinha preta de macumba!", todos riram, e um outro emendou: "deixa ela vacilar que vai pra panela".
No dia 30 chegaram alguns amigos meus, C, V e E. Eles iam acampar em outro camping, mas como já estavam todos lotados e sabiam que eu estaria por ali, resolveram me fazer companhia.
Como bons amigos, trouxeram comida, muita comida.
A galinha não saia de perto dos alimentos. Assim que a gente se afastava do acampamento, lá ia a galinha e começava a bicar tudo que se encontrava disponível. As outras galinhas também se aproximavam, mas assim que a gente as tangia corriam e não voltavam. Já a galinha preta não se afastava de jeito nenhum e dormia por ali mesmo.
Em um dos dias montei um pratão daqueles de pedreiro, arroz, feijão, salada - a fome era grande - e quando me virei pra pegar o suco .... lá estava a galinha, praticamente dentro do meu prato.
Minha irritação foi tamanha que peguei um arbusto que estava jogado e sai com sangue no zóio tentando dar uma lição definitiva na galinha impostora.
Corri por cerca de 15 minutos pelo meio da mata tentando pega-la, sem sucesso é óbvio, mas satisfeito pelo fato dela ter ficado bem distante do acampamento e dos alimentos.
Fomos à praia e quando voltamos, quem estava lá? A galinha.
No outro dia pela manhã, enquanto aguardava uma pessoa tomar banho na ducha, vi um galo branco enorme, e quando falo grande, é porque era grande mesmo.
O galo que provavelmente era o garanhão do galinheiro, além de seu tamanho, chamava a atenção por puxar uma das patas, que em algum momento de sua vida sofreu uma fratura.
De repente esse galo entra no galinheiro, repleto de galinhas, cerca de 20 pelo menos e o desespero tomou conta das galinhas.
Com uma violência que eu nunca tinha visto antes, o galo pegava as galinhas e com toda a força as bicava nas costas, arrancando penas e o coro. Algumas saiam pingando sangue.
Por uma fresta na tela que cercava o galinheiro, as galinhas se espremiam para fugir da violência do galo. A violência do galo não era para copular com as galinhas, era pura violência, pura maldade mesmo, tipo dizendo: "quem manda nessa porra sou eu!"
Ai pensei na galinha preta que vivia rodeando minha barraca. Mas dessa vez com um sentimento de pena, de dó. Provavelmente ela se recusará a descer e viver enclausurada no galinheiro sofrendo a violência das bicadas do galo.
Por isso vivia isolada das outras galinhas, sem a comida fácil que lhe era jogada pela Dona Maria no galinheiro, sendo obrigada procurar e viver do alimento encontrado na mata: formigas, minhocas, grilos, vaga-lumes, cigarras e coisas furtadas dos campistas.
Mas depois pensei que eu não deveria ter dó e nem pena da galinha, afinal, ela teve a coragem de fugir do galinheiro e se recusar a viver no sofrimento. Preferiu a reclusão à submissão. Preferiu a violência do vento e da chuva ao sofrimento de viver sendo espancada diariamente em um galinheiro.
Na minha brisa, comecei a pensar na galinha como uma heroína, um exemplo de postura para todas as outras galinhas do galinheiro, e porque não do mundo?
Pensei que quando as outras galinhas subiam a mata para ciscar, se não sentiam inveja da independência da galinha preta que se recusou a apanhar gratuitamente todos os dias?
Pensei até se se a galinha preta não fazia discursos para convencer as outras, tipo, galinhas do terreno da Dona Maria, uni-vos!
Todos esses pensamentos enquanto eu esperava pra tomar banho. Mas depois disso passei olhar a galinha preta com outros olhos e passei a respeitá-la.
Parei de pertuba-la por querer furtar nossa comida.
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